A psicoterapia infanto juvenil oferece um espaço de escuta, cuidado e elaboração simbólica das vivências que marcam a infância e a adolescência — fases cruciais do desenvolvimento humano. Nesse período, a criança estrutura seus alicerces emocionais, afetivos e psíquicos. Quando esse processo se interrompe, se distorce ou não encontra acolhimento adequado, a criança pode desenvolver dificuldades emocionais, comportamentais e relacionais.
A visão psicanalítica do sofrimento infantil
Desde Freud, que iniciou os estudos sobre a estruturação da psique humana, até pensadores como Melanie Klein e Donald Winnicott, a psicanálise se dedica a compreender a complexidade emocional de crianças e adolescentes. Freud revelou que os conflitos inconscientes já se manifestam nos primeiros anos de vida. Melanie Klein aprofundou essa ideia ao mostrar como a fantasia permeia o universo infantil, ganhando forma por meio de jogos, desenhos e brincadeiras.
Donald Winnicott contribuiu de maneira essencial ao destacar o papel do ambiente na formação do self. Ele cunhou conceitos como “mãe suficientemente boa” e “espaço potencial”, que ajudam a compreender por que uma criança que cresce em um ambiente instável pode apresentar sintomas emocionais.
A psicopatologia winnicottiana enriquece a clínica psicanalítica ao orientar o diagnóstico e nortear o trabalho terapêutico. O terapeuta observa a idade emocional do paciente para compreender sua imaturidade e acompanhar seu amadurecimento emocional. Essa abordagem se mostra especialmente eficaz nos chamados “casos difíceis”, que a psicanálise tradicional não conseguia alcançar. A psicoterapia infanto juvenil, sob essa perspectiva, aposta na “cura pelo cuidado”.
Ao oferecer um espaço simbólico e relacional, a psicoterapia infanto juvenil acolhe o sofrimento psíquico e o transforma em possibilidade de crescimento.
Abordagens e recursos na psicoterapia infanto juvenil
A psicoterapia infanto juvenil — sobretudo na abordagem psicanalítica — utiliza métodos que respeitam a linguagem simbólica da criança. O terapeuta escuta, com atenção analítica e sem julgamentos, aquilo que a criança expressa por meio do brincar, do desenho, das histórias e até dos jogos digitais. Esse processo favorece a elaboração dos conflitos internos.
Sandor Ferenczi enfatizou a importância da empatia e da autenticidade do terapeuta, principalmente ao trabalhar com crianças traumatizadas. Christopher Bollas contribuiu com a ideia do “saber não pensado”, explicando como crianças carregam experiências não verbalizadas que influenciam sua forma de estar no mundo. A psicoterapia dá forma a esses conteúdos, permitindo que eles encontrem uma via simbólica de expressão.
O terapeuta deve ajustar o processo terapêutico à idade e à maturidade emocional do paciente. Com adolescentes, o diálogo verbal assume maior protagonismo, mas a escuta das fantasias e dos afetos continua essencial.
Psicoterapia como ferramenta de transformação
A psicoterapia infanto juvenil atua diretamente em situações como bullying, separações familiares, perdas, traumas, dificuldades escolares ou medos intensos. Crianças e adolescentes, muitas vezes, comunicam seu sofrimento por meio de sintomas, já que não conseguem expressar o que sentem em palavras.
Os sintomas são formas de comunicação do sofrimento que a criança ou o adolescente não consegue colocar em palavras.
A análise compreende esses sintomas como manifestações de um sofrimento mais profundo, que precisa ser escutado e simbolizado. Em vez de silenciar ou rotular, o terapeuta busca entender o que o sintoma quer dizer. Nesse processo, a escuta cuidadosa promove transformação.
O sofrimento psíquico dos super heróis
Muitos filmes, desenhos animados e quadrinhos retratam o sofrimento emocional e a importância do cuidado psíquico na infância. Divertida Mente (Inside Out), da Pixar, mostra de forma sensível como emoções como tristeza, raiva, medo e alegria participam da construção psíquica infantil. O filme ensina que nenhuma emoção é “ruim” — todas têm um papel fundamental.
O personagem Batman, por exemplo, carrega marcas profundas da perda dos pais na infância. Embora nunca tenha feito psicoterapia nas histórias clássicas, sua trajetória poderia ter sido diferente caso tivesse recebido acolhimento emocional.
Em Harry Potter, observamos os efeitos do abandono, do luto e do bullying. A escola de magia, em certo sentido, funciona como um lugar simbólico de reconstrução emocional e identidade. Esses exemplos mostram como a psicoterapia infanto juvenil pode cuidar de feridas psíquicas antes que se tornem dores crônicas.
Desafios e resistências à psicoterapia infanto juvenil
Apesar da sua importância, a psicoterapia infanto juvenil ainda enfrenta resistências. Muitos adultos subestimam o sofrimento infantil e acreditam que os sintomas desaparecerão com o tempo. Essa negação geralmente reflete o medo dos próprios pais de encarar suas feridas emocionais.
Outro desafio vem da medicalização precoce. Em muitos casos, profissionais recorrem rapidamente a medicamentos sem investigar a origem psíquica do sintoma. Isso não nega a relevância da psiquiatria, mas destaca que, muitas vezes, é a escuta que transforma — ou ao menos inicia esse processo.
A psicoterapia infanto juvenil representa, acima de tudo, um gesto de cuidado. Ela oferece à criança ou ao adolescente um espaço onde possam ser escutados em sua singularidade. A terapia aposta na possibilidade de encontrar, mesmo nas experiências mais difíceis, uma via criativa e transformadora.
O vínculo como base do desenvolvimento emocional
Winnicott afirmava: “não existe bebê sem alguém que o sustente”.
A frase acima se aplica a todas as idades. Não existe sujeito sem vínculo. A psicoterapia oferece esse vínculo reparador, baseado na escuta, no brincar e na simbolização como caminhos para o amadurecimento emocional.
Se você percebe que seu filho ou filha enfrenta dificuldades emocionais, comportamentais ou sociais, procure um psicólogo com experiência em psicoterapia infanto juvenil. Esse cuidado pode transformar não apenas a vida da criança, mas também a dinâmica familiar como um todo.